21 dezembro 2007

feliz natal e ano novo


19 dezembro 2007

nuvem

uma nuvem passou
aventureira nuvem
choveu em mim
e foi embora...

18 dezembro 2007

...

insaciabilidade
sentimento inquieto
coisa de dezembro
há qualquer elo perdido
...
nenhuma palavra
expressa este sentimento
calo...

12 dezembro 2007

seqüência

pisar o chão
tocar o céu
chegar à terra
do leite e mel
a vida é doce
e também fel

combinar os extremos
na arte de viver
misturar os ingredientes
e ter coragem de beber
degustar cada parte
na compreensão do ser

entre iguais
ou contrários
a certeza é correnteza...

11 novembro 2007

mancha

sou parte de um todo
de uma história complicada
da raça humana extensão
herdeiro de uma cilada
dizem que já nasci
com uma falta registrada...

04 novembro 2007

rumor

não é desespero
pode ser misto
de agonia e calma
sufoco do dito
e não dito
sede da alma
mergulho na lama
vá lá
deixa a trama
mata a fome
de gana de ser
do não-ser
idade que nada
deixa que ninguém
entenda
compreender é padecer
ressuscita
transita
morrerás louco
oco
pode ser
que reste
o eco...

02 novembro 2007

taciturno

estou oco
casca de cigarra
que explodiu
não, não sou santo
não pense assim
sobre mim
perfeição não
sou cristão-pagão
errante
de muito ignorante
"sobre o que não se pode falar,
deve-se calar"
agora sou só
silêncio...

28 outubro 2007

luta

de nada adianta
esta cara de anta
levanta
sacode a poeira
segue adiante
vai pela beira
evita viseira
de doer, dói
corrói
lateja
mas a vida
é uma peleja
todo dia...

26 outubro 2007

telha

sem manual
nada de instrução
nada de receita
mas suspeita
peita o conceito
abrace a intuição
segue clandestino
escreve o destino
em desatino
sem razão...

25 outubro 2007

porção

dedos falam
gritam, esperneiam
teclam no profundo
tocam o mundo
perdem-se nos fundos
nos abismos
dedos choram
dedos amam
dedos deslizam
em letras interditas
dedos
plural solitário
na vazia noite
dormem
distraidos
dedos
vagueiam no subterrâneo
nos sonhos e escapes...

20 outubro 2007

panorama

a angustia move
a vida comove
hoje faz sol
amanhã chove
se há dúvida
prove...
em mim
sertão, serra, cerrado
morro e descampado
não cabe aqui
certo ou errado...

18 outubro 2007

menino kauã

quatro aninhos
e uma bala no peito
quem matou kauã?
disseram que
a polícia não mata, age
11 pessoas mortas...
a tv mostrou
mata-se de cima
pra baixo
e o governador
cabral elogiou
há uma carta branca
pra tirar vidas...

15 outubro 2007

tropa

“na cara não
pra não estragar o velório”
última frase de tropa de elite
em seguida o estrondo da 12
trummmmmmmmmmmmm
a elite nem se assusta
vibra na poltrona...

13 outubro 2007

espécie

sou pedra que se quebra
sou água que congela
sou barro
sou bafo
hálito divino
sou fogo roubado
prometeu
sou apenas
eu
sou sorte
destino
sou múltiplo
sou grego
latino
sou mancha
sou pecado
sou anjo
amado
demônio
odiado
sou tudo
sou nada
sou rio
sou poça
sou gota
sou carne
osso
sou água parada
ou ressaca valente
sou animal bicho
e me deram o nome
de gente...

12 outubro 2007

ânsia

no horizonte
um sonho distante
mas não pode viver
apenas em função
daquele ausente
há de agarrar o presente
e o que virá mais tarde
sem alarde
será complemento
do hoje bem vivido
e o bem vivido
não quer dizer
ausência do sofrer
até o sofrer pede
um sentido...

07 outubro 2007

outubro

quase não dormiu
na verdade
dormiu nada
presentia um novo nascimento
acendeu a lamparina a querosene
e madrugou preparando o barro
tinha que terminar as encomendas
panelas, alguidares, potes...
de barro
moldados com suas mãos
mãos de mamãe
alguma coisa teve de inventar
para conseguir
o bocado dos pequenos
uma fila de inocentes
ali ressonando
nas fiangas de rede
tanto armador na casa...
o dia nasceu vemelho
o sol despontou
qual bola de fogo
o sertão é quente
outubro é mais ainda
e as dores aumentando
de parto
deixou tudo arrumadinho
casa, roupa, comida, tudo
e as dores aumentando
é quase meio-dia
é quinta-feira
chama a parteira
esvazia a casa
manda os pequenos
para a vizinhança
por volta das 12h
o sol a pino
lá fora o horizonte
tremia
e no quarto
dor e suor
nasceu
é menino...

03 outubro 2007

alameda

ali o juízo
respira
expira
ali o juízo
padece
esquece
ali o juízo
suplica
complica
ali o juízo
acalma
alma
ali o juízo
chora
implora
ali o juízo
cansa
amansa
ali o juízo
voa
coa
ali o juízo
some
come
ali o juízo
esquece
amolece
ali o juízo
alumia
chia
ali o juízo
é
...

02 outubro 2007

visita

para zeli

havia pensado palavras
algo para dizer
à dona cecília
mas falei pouco
às vezes palavras
são dispensáveis
cheguei lá
a cumprimentei
ela tão serena
olhos de paz
simples como criança
olhar de afeição
mãe
mamãe
nona
palavras sonoras essas
e fiquei ali
apenas presente

contemplando
ouvindo
participando
na despedida
quis pedir a bênção
como faço a minha mãe
não precisou
com três beijinhos
sem palavras
ela me abençoou...

avante

setembro se despediu lindo
pelo menos aqui em caxias
o dia 30, último domingo
foi um show de beleza
tudo de graça
ao ar livre
o sol brilhou forte
e o céu de tão azul
parecia tocar a terra
os plátanos vibrantes
com seu novos brotos
dançaram ao ritmo do vento
e a grama toda verdinha
encheu nossos olhos de esperança
tudo sinalizou para o horizonte
horizonte de vida abundante
é a primavera engatinhando
é tempo de fertilidade...

30 setembro 2007

leva

não é estranho
nem engano
não é
coisa qualquer
olha e encara
cara-a-cara
sem preceito
ou preconceito
não se engane
não entre em pane
apenas ama
ama e viva
da vida
só o amor
a gente leva...

piçarra

olha para trás
e ver sombras
passado rápido
qual relâmpago
a queimar o âmago...

passado efêmero
presente inquieto
de uma alma sedenta
na buscas do elo originário...

hora sem graça
sol fora e noite dentro
angústia e desespero
lua cheia escondida
por trás de uma nuvem fingida...

temporal vem e vai
e o ser despedaça
no compasso do tempo
naquele ritmo cloc, cloc
consome
e some



29 setembro 2007

pedaço

engoliu o bocado
saiu apressado
sozinho na multidão
mais tarde
reparou nos olhos
viu solidão
pediu palavras
a língua não deu
nenhuma métafora
nenhuma rima fácil
sofreu
adormeceu...

20 setembro 2007

pegadas

tudo bem
pega o que ainda resta
passa a mão na testa
apaga a inscrição
vai pela a esquerda
quebra o padrão
pigarreia a tristeza
engole a solidão
mas não some
junta as letras
e rabisca o nome
depois corre
vai com os pés às avessas
sem muita pressa
se não segurar
chore
eu sempre faço isso
choro
pelos sonhos
por mim
por você
sei lá
preciso dizer o porquê?
...

17 setembro 2007

antes da noite


a hora de um sentimento
de nome saudade
aquele instante, pede colo
e o corpo quer asas...

o pensamento vai e vem
em direção de alguém
alguém que deixou rastros
cheiros, lembranças..

e depois ralos, lágrimas
nem houve adeus...

15 setembro 2007

cazuza

" ... estou grávido mais não posso esperar
o tempo não pára e agente ainda passa correndo...
se pudesse, guardava tudo numa garrafa, e bebia de uma vez
penso no que vai ficar de mim
eu... só sei insistir."

vasto

no horizonte um ímã
puxa, puxa, puxa...
por um instante
a vida se eterniza

num momento de beleza
e prazer...

14 setembro 2007

lá onde for



qual flor de ipê
efêmera
e a vontade de ser
ser além do ente
ser simplesmente
e às vezes nem ser
tão decente
apenas ser
e nada mais
apenas paz...

12 setembro 2007

pingo no "i"

silêncio e cheiros
e folhas dançando
e o ritmo do vento...
e solidão e natureza
e plátanos em viço
e o ser sem certeza...
e o colorido da esperança
e a desilusão feito nó
e a tempestade e a bonança...
e o desejo mais secreto
e a teoria literária
e o carinho discreto...
e a hora triste
e o olhar que pede
e a boca na língua...
e o balanço da rede
e a flor da pele
e a corrente filosófica...
e o tempo em fuga
e a abelha que pica
e a distração tentadora...
e as lágrimas e os sorrisos
e os tantos "iis"
infindo pingo...
infindo "i"...

10 setembro 2007

memória

ensina a sabedoria popular:
recordar é viver
por trás dessa frase
há muito o que aprender
tem a ver com memória
nosso jeito de ser...

daí nossos álbuns
e datas festivas
registro da história
pessoal e coletiva
buscamos sentido
nas narrativas...

memória, memória, memória
invo-te em jaculatória...

09 setembro 2007

obstrução

conhecimento rima com alimento
uma pena que ambos sejam mal distribuidos
dói saber que a fome e a ignorância
ainda matem tantas vidas...

04 setembro 2007

bagatela

qual pilatos no credo
é como se sente
meio fora de contexto
sem presente
apenas passado
e sede de futuro
na cara estampado
um compêndio
nas linhas e rugas
e nas marcas de incêndio
e nas cinzas do pau torto
ou não seria mesmo o anjo torto
aquele do Poeta...

31 agosto 2007

palavra II

Vejo-me de volta à biblioteca. Olho para as prateleiras. Os livros me remetem à imagem das lagartas em metamorfose no outão de casa.
No sertão, quando víamos algum casulo dependurado, dizíamos ser “lagarta encantada”.
Cada livro ali parece “encantado”. A letra parece envolta num casulo. Penso na voz como potência criadora, capaz de tirar a letra do estado de “encasulamento”. Faço uma imagem mental daquela ação vocal do mito da criação: "faça-se", e que por meio dela tudo passou a existir...

27 agosto 2007

palavra I

Entro na biblioteca e contemplo os livros nas prateleiras. Enquanto os observo, o pensamento me transporta para uma cena da adolescência: estou no sertão. Sinto o cheiro de terra molhada pelas primeiras chuvas do ano. O barulho das gotas nas telhas anuncia que em breve, aquele quadro de natureza morta, dará lugar a uma paisagem viva. Em pouco tempo, ouço os coaxos dos sapos, que parece surgirem do nada, fazendo a festa nas poças e grotas. Em menos de três dias, do torrão antes seco e rachado, as sementes “desencantam” e brotam em tufos, espalhando o verde na caatinga. No cenário de ressurreição, a vida vibra e tudo respira renascimento. O ar cheira a fertilidade. Nas folhas novas das árvores surgem lagartas de muitos tamanhos e cores. Elas logo se dirigirão aos outões das casas, aos lugares protegidos da chuva e se transformarão em casulos, aguardando o tempo certo de se tornarem belas borboletas...

25 agosto 2007

marginal

segue mesmo no anônimato
vai pela rua ou pelo mato
tal cachorro vira-lata
gane baixinho a dor
dor de saudade e amor
tenta escarrar o catarro
engasgado no pescoço
mas dói o osso
osso duro de roer
cravado no ser
ser enquanto ser
angustiado pela finitude
ansiando plenitude...
segue noite adentro
em busca do sentido
na margem dos versos
versos livres, vivos
no terreno do reverso
lá onde não se é normal...

23 agosto 2007

lá fora

... e aqui dentro
sem tempo
para espiar
ali pela janela...
então corro
e tento tocar
a tela do tempo...

19 agosto 2007

suspiro

arranca o sentido
tira da goela
mergulha na noite
adentra o labirinto
noite sem lua
essa noite é você mesmo
arranca o sentido dela
dos poros sem suor
vazios de calor
se não há
inventa qualquer sentido
para suportar
todas as reticências...

14 agosto 2007

dúvida

acha que sabe tudo
sabe nada não
cada página que se abre
é uma nova questão
quem pensa saber demais
vive de mera ilusão...

11 agosto 2007

fontes

lethe e mnemosyne
esquecimento e memória
esquecimento é a água da morte
bebê-la é adentrar o reino das sombras
memória é a fonte da vida
da imortalidade
quem beber a água de mnemosyne
transcende a condição mortal
não encontra barreira
entre a vida e a morte
é livre cá e lá
nas sombras e na luz...

10 agosto 2007

sem sobrenome
apelido em vez de nome
condenado à fome
antes de nascer
vive a padecer
em estado primata
pior que barata
nos ralos e esgotos...
mas não é bicho, é gente
isso ainda sente
embora diferente
dos limpos corpinhos
desfilando à sua frente...
agora
quer gritar
sua dignidade cobrar
porém não reclama
nesta hora
só queria uma cama
pra adormecer com prazer
e não mais acordar...

09 agosto 2007

na meta

entre doxa e episteme
barco e leme
terra e céu
fel e mel
balbuciando
s e r e n i d a d e . . .

04 agosto 2007

intra

vá lá
vomita as vísceras
arranca das entranhas
as estranhas e tão humanas
imperfeições
vá lá
lança sem pudor
a dor escondida
contida
e desvela a ferida
gástrica do amor
vá lá
mostra o avesso
os apertos
os desacertos
o deserto interior...

03 agosto 2007

gotas

lágrimas
que banham o rosto
sentimento salgado
e o gosto
da dor líquida...

01 agosto 2007

pérola

o céu é um tesouro escondido
no campo da vida
ele é o sentido
da nossa lida
e de nosso ser
na totalidade...
o céu são nossas opções
feitas pela felicidade
misto de razão e emoção
dor e delícia
porque o céu é também sofrer
não é somente gozo e prazer
mas é também gozo e prazer...
o céu é uma pérola
de grande valor
é o amor
sobre o qual
não abrimos mão
e por ele damos a vida
para nunca morrer...

31 julho 2007

sopro

por enquanto, silêncio
paciência, coração meu
valerá a pena
segue serena
alma minha...

29 julho 2007

sinal de igualdade

a morte nos iguala
ela nos cala
vai embora a arrogância
de nada vale a ganância
a morte nos move
ela nos comove
nos cobre de tristeza
e se há uma certeza
ela é uma
para todos...

28 julho 2007

bênção

os plátanos despidos
as hortências tristes
mas o sol sorri
e o céu azul me abraça
a paisagem invernal
me tende para dentro
de mim
na acolhida, uma frase:
"que você seja uma bênção de Deus."
assim seja...

16 julho 2007

mudança de rota...

outra rota
lá vou eu
de novo
partido
coração aos pinotes
sem vergonha de chorar
valeu beagá
terei algo bom
para lembrar...

15 julho 2007

por aí...

ando por aí
procurando ler
o tempo
em prosa, em verso
em não sei o quê
quando há clima
encontro rima
noutras vezes
o silêncio fala
eu me calo
arregalo os olhos
e contemplo o inefável...

14 julho 2007

ALEGRIA

sábado. dia vivo
hoje não quero sombra
talvez água fresca
pois a rua me chama
vou me permetir
folga e ócio
pra vida sorrir
vou lá fora
hoje o mundo é minha casa
o amor também
tudo parece único
primeiro e último...

08 julho 2007

fome de beleza

atrás do sorriso banguela
do olhar apagado
do rosto enrugado
de ser ele ou ela

atrás do poço sem fundo
de uma vida marginal
dos eteceteras e tal
de se sentir imundo

atrás de toda a exclusão
e do nome vagabundo
dos vômitos e dores

atrás dos temores
dos vácuos e frios
tem fome de beleza...

07 julho 2007

7.7.07


dia bem azulzinho
no horizonte de beagá
hoje arrumo a bagagem
tenho que te deixar
logo, logo partirei
olha,
mando notícia de lá...

22 junho 2007

rumo

tenho pouco
e muito de louco
já nasci na margem
descifrando mensagem
de um além mundo
meio raso e profundo
sem regalia e sem fartura
na vida quente e dura
sem nenhuma frescura
mas sempre a frente
um vasto horizonte
me revelando um monte
de esperança e encanto
sem negar o meu canto...

18 junho 2007

compreender e perdoar

o que passou é irrevogável
só resta a reconciliação
com o inevitável...

16 junho 2007

desejo vivo

sede de ti!
ao menos um gole.
hoje bastaria somente
uma gotícula de ti.
e tudo o mais esqueceria.
contigo, cronômetro nenhum...

14 junho 2007

passarim

o pássaro é colocado na gaiola
no início inquieta-se, bate as assas
vai pra lá, pra cá, sobe, desce
se chora, não revela as lágrimas
mas o próprio olhar é choro...
com o tempo acalma-se
só externamente
pois no íntimo
explode em vulcão
angústia e dor
grades...

13 junho 2007

profecia

uma musa me soprou:
- serás nômade
aqui e lá
por onde fores
estrangeiro
sentirás...

03 junho 2007

no peito, um nó
na garganta, um grito entalado
e os plátanos todos tristes...

01 junho 2007

cidadania no ritmo de cordel

este é meu livrinho de cordel. editado pela Paulus


[...]
a polis (cidade) grega
é o marco original
da concepção cidadã
e de sua função como tal
ali os homens livres
pensam a vida social
[...]
no caminho da cidadania
no que se refere ao Brasil,
nem sempre todos foram
filhos da pátria mãe gentil.
os pobres foram largados
debaixo do céu de anil
[...]
no país que bem se preze
na arte de governar,
criança não passa fome,
tem casa boa pra morar,
é protegida e amada,
e seu trabalho é brincar...

28 maio 2007

dia assim

acordou cedo e saiu ao léu
não era da terra nem do céu
encontrava-se noutra dimensão
o corpo em sensação de paz
de serenidade e quase eternidade
no entanto, alguma coisa pedia mais
esse mais é sempre aquela margem
ou certo buraco escuro
quem sabe algum muro
dentro da gente
qualquer oco em nós
porém, no geral estava bem
o dia claro havia juntado céu e terra
dois em um
por isso não era terra
nem céu...

25 maio 2007

o que vale


o que restará
de meus
dias corridos
das horas coagidas
das noites curtas
ou eternas
dos prazos cumpridos
das angústias presentes
da pressa ferrenha
dos compromissos de agenda
de tudo que me fende
?
...

palavra e cor

não sei porque
mas a palavra VERDADE
quase sempre me remete
a SANGUE...

22 maio 2007

portão


hoje, na saída da UFMG, no acesso à avenida antônio carlos, um cara me abordou:
- você gosta de poesia?
não esperou minha resposta, apresentou logo um folheto de capa vemelha com o título:
PA
LA
VRA
RIA


estava apressado e não pude fazer muitas perguntas. perguntei se as ilustrações eram de autoria dele também.
- não, é de um amigo. disse.
perguntei o valor: r$ 5.00. Comprei e sai às pressas. desejei bom trabalho. Ele disse:
- muito obrigado, cara!
Depois, no ônibus, me arrependi por não ter conversado um pouco mais. Amei cada verso com prazer. É tudo muito louco, anormal.
Cito um poema:

a fundo

tipo de coisa que consome
descaso
naufrago em mim
pingo feito torneira frouxa
me esvaindo
esvaindo de mim tudo que é do outro
contrário disto
me concentraria feito pimenta ardida
do gueto
ou caçachaça alambicada
da praça
e lá
naqueles bancos de concreto
qualquer voz é música
qualquer ser é Deus
qualquer gole é ouro,
qualquer coisa eu enloqueço
abandono as preces, os prazos
os prazeres
e vou de gozo em gozo gritando além.

(renato limão - edição independente - direitos reservados. renato_limão@yahoo.com.br)



20 maio 2007

aperto

"a glória de Deus é o homem vivo".
a glória de Deus é a pessoa humana saudável, feliz,
com casa, comida, agasalho, educação,

trabalho, lazer; com vida plena...
para mim, o céu tem que começar aqui.
não tem essa de sofrer nesta vida

para ganhar um prêmio de vida feliz na outra.
essa é uma idéia há muito superada,

que serviu para os podesosos explorarem os pobres
em nome do medo dos horrores do inferno...
inferno é passar fome, ficar doente e não poder se tratar,

passar frio e não ter agasalho, aquecedor,
sentir fome e não ter nada para comer,
não ter oportunidade de trabalho
e ainda ser tratado como vagabundo...
inferno é a total ausência de vida; de sentido,
inferno é o não sentido....

19 maio 2007

na terra


solidão acompanhada
silêncio nunca calado
segue avante a estrada
sobe às alturas alado...
se as asas não alçam vôo
ainda é tempo do chão
pisa firme o aqui e agora
mente, vontade, emoção
junta sem medo algum
intelecto e coração...

12 maio 2007

a foto


para mamãe Mirian

pegou a foto com ternura. olhou-a fixamente, imóvel. tempo quase eterno. seus olhos nem piscavam. ambos, foto e pessoa, eram imagens congeladas. uma lágrima silenciosa brota de seu olho esquerdo. lentamente escorre, enquanto outra, desponta do olho direito. ambas deságuam na boca. gosto salgado, amargo. seus olhos são duas fontes, dois riachos correndo em direção ao mar da saudade. saudade do filho ausente que tanto ama e gostaria de tê-lo sempre ao seu lado. lembra-se daquele triste dia que o viu partir para cidade grande, em busca do sonho, do desconhecido, das promessas de futuro feliz. tão jovem! recorda-se do abraço apertado, aquele abraço de até mais. Deus te abençoe, meu filho, Deus te acompanhe. seu coração está apertado. é que hoje, a saudade bateu à sua porta sem pena, nem piedade. o único alento é ver a foto, exatamente aquela sobre a cômoda. fica sempre ali, para ser apreciada. é como a presença viva do filho ausente. sabe que um dia o filho teria que deixar a casa para escolher seu rumo, ou o que a vida se encarregaria de mostrar. no entanto, era muito cedo para ele fazer isso, pensa. sente neste momento, imensa necessidade de dizer ao filho o quanto o ama. arrepende-se de em certos tempos não ter expressado com palavras e gestos esse amor especial. se bem que, amor de mãe não precisa de palavras, mas é o que ela pensa neste momento de saudade contida.

06 maio 2007

ocaso

uma lágrima feito rio
um sorriso e um arrepio
vida feita de lembrança
no coração uma lança
não sai água nem sangue
mas lama preta do mangue...

no fundo do poço há restos
dos momentos indigestos
das situações sem sentido
e daquela dor e gemidos
que arderam como brasas
deixando minha alma rasa...

sol de outono


pela fresta da porta
entra um raio de sol
e me convida para a rua
abro as cortinas e me assombro
com a beleza do sol outonal
ele beija serenamente a grama
e afaga carinhosamente a manhã dominical...

na margem

arrasta-se qual lagarto
nas fronteiras do capital
passa fome, sede, medo
vale menos que animal
clandestino, rumo incerto
entre o bem e o tal do mal...

03 maio 2007

só riso

o cheiro de lençol limpo
o abraço com o travesseiro
o corpo quente e trigueiro
beleza mesma do olimpo...

a vida naquele palpite
a respiração serena
um close-up da sena
a fome e o apetite...

o olhar sem sensura
a boca em sorriso
sem precisar de jura...

tudo em ordem e preciso
sem norma ou frescura
respiração, e só riso...

01 maio 2007

maio


levantou
abriu a cortina
um dia vivo o abraçou
o sol sorria à matutina
e a brisa soprava seu hálito
odor da vida teimosa
sentiu-se quase infinito
na cena serena e misteriosa
era o milagre da vida
uma nova página a ser lida...

insônia

são olhos que pedem
paz e sossego
pedem sono, sonhos
e aconchego
são olhos que vagam
qual vaga-lume
no vasto negrume
das noites eternas
são olhos que esperam
contra toda esperança
o dia da bonança
são olhos que pedem...

27 abril 2007

olheiras


levantou com olhar de urso panda
o sol lá em cima disse:
toma teu novo dia e anda...

25 abril 2007

horizonte

sou carne e osso
pedra que se quebra
água que congela
fogo...
sou o ar que sopra
redemoinho, tufão
raio, nuvem e trovão
poeira...
sou segredo e medo
um mundo de mistério
livre radicalmente
nada me determina difinitivamente
transcendente...

21 abril 2007

porção

bela beleza
não quero certeza
nem meias-verdades
sim, suporto saudades
até finjo e me assalto
subo no muro e salto
mas não minta assim
não arranque de mim
o pedaço que resta
da frase na testa
aquela frase torta
que era nossa porta...

20 abril 2007

brisa


na língua, gosto de existência salobra
nas mãos o tremor da manobra
manobra e desafios de ser
ser sem a dor da morte
sem depender da sorte
ser inteiro e não farelo

poder fruir do belo
da beleza sem moda
que até me deixe nódoa
e me acorde, desperte
o que em mim é inerte...

18 abril 2007

remoto


oco, cinza, vazio
forte desassossego
ainda afeito ao apego
numa existência sem brio

é como fosse e não fosse
estivesse e não estivesse
uma sensação inominável
um sentimento detestável

imediatismo cruel
não se compromete
mas na vida se mete
espalhando seu fel...

16 abril 2007

na lama

sorriso de dentadura
semblante de amargura
na testa uma inscrição
que a torna separada
sem futuro e desgraçada
tendo o destino a exclusão

fede mais que lixo
vista como bicho
sua casa é a rua
já nem sente medo
uma vida sem segredo
de alma fria e nua...

15 abril 2007

silenciosa reza

de joelhos e mãos postas
numa reza toda inocente
não precisou de palavras
para expressar o que sente
bastou mesmo aquele gesto
aos pés do onipotente

aos pés do onipotente
que ela nem sabe quem é
só mais tarde atentará
por qualquer visão de fé
não precisa de conceitos
nem da profissão de Tomé

aquela cena infantil
muito me comoveu
a mensagem icônica
por si só já valeu
a oração da criança
acordou o peito meu...

14 abril 2007

o encantamento da palavra e a transformação do mundo

hoje vivemos uma manhã especial no auditória da paulus em belo horizonte. um momento de poesia, no qual cada participante declamou e improvisou cordel. posto aqui alguns versos feitos no calor da hora. obrigado a você que esteve lá.

de Cecília e Roselia:

ó senhor consumidor
preste muita atenção
pesquise sempre meu amigo
para não cair em tentação
cuide bem do seu bolso
para não ficar sem um tostão...

de Vânia, Isis e Cristina:

cidadão da esperança
votaram na reeleição
deu a Lula no 2º turno
esperança de renovação
ao chegar 1º de maio
salário mínimo: que decepção

presidente metalúgico
em 30 momentos da história
revelou ser um lutador
em busca de sublime glória
disse defender um grande povo
mas buscou sua própria glória...

de Maria do Carmo, Nara, Antonia e Églesson:

peço a deus inspiração
pra falar nesse cordel
pra falar do carnaval
que não é festa do céu
dança pobre e dança rico
de soldado a coronel

carnaval é alegria
é festa pra esquecer
problemas do dia-a-dia
pro povo se envolver
de sexta a terça-feira
pra depois se arrepender

na 4ª deira de cinza
pedimos perdão a deus
por beber e por pecar
ao peixe se diz adeus
pensamos no bacalhau
no seu fogão e não no meu

agradecemos o Antonio
pela aula de cordel
foi muito interessante
lhe tiramos o chapéu
obrigado ô Antonio
nada vai fica ao léu...