12 maio 2007

a foto


para mamãe Mirian

pegou a foto com ternura. olhou-a fixamente, imóvel. tempo quase eterno. seus olhos nem piscavam. ambos, foto e pessoa, eram imagens congeladas. uma lágrima silenciosa brota de seu olho esquerdo. lentamente escorre, enquanto outra, desponta do olho direito. ambas deságuam na boca. gosto salgado, amargo. seus olhos são duas fontes, dois riachos correndo em direção ao mar da saudade. saudade do filho ausente que tanto ama e gostaria de tê-lo sempre ao seu lado. lembra-se daquele triste dia que o viu partir para cidade grande, em busca do sonho, do desconhecido, das promessas de futuro feliz. tão jovem! recorda-se do abraço apertado, aquele abraço de até mais. Deus te abençoe, meu filho, Deus te acompanhe. seu coração está apertado. é que hoje, a saudade bateu à sua porta sem pena, nem piedade. o único alento é ver a foto, exatamente aquela sobre a cômoda. fica sempre ali, para ser apreciada. é como a presença viva do filho ausente. sabe que um dia o filho teria que deixar a casa para escolher seu rumo, ou o que a vida se encarregaria de mostrar. no entanto, era muito cedo para ele fazer isso, pensa. sente neste momento, imensa necessidade de dizer ao filho o quanto o ama. arrepende-se de em certos tempos não ter expressado com palavras e gestos esse amor especial. se bem que, amor de mãe não precisa de palavras, mas é o que ela pensa neste momento de saudade contida.

06 maio 2007

ocaso

uma lágrima feito rio
um sorriso e um arrepio
vida feita de lembrança
no coração uma lança
não sai água nem sangue
mas lama preta do mangue...

no fundo do poço há restos
dos momentos indigestos
das situações sem sentido
e daquela dor e gemidos
que arderam como brasas
deixando minha alma rasa...

sol de outono


pela fresta da porta
entra um raio de sol
e me convida para a rua
abro as cortinas e me assombro
com a beleza do sol outonal
ele beija serenamente a grama
e afaga carinhosamente a manhã dominical...

na margem

arrasta-se qual lagarto
nas fronteiras do capital
passa fome, sede, medo
vale menos que animal
clandestino, rumo incerto
entre o bem e o tal do mal...