31 agosto 2007

palavra II

Vejo-me de volta à biblioteca. Olho para as prateleiras. Os livros me remetem à imagem das lagartas em metamorfose no outão de casa.
No sertão, quando víamos algum casulo dependurado, dizíamos ser “lagarta encantada”.
Cada livro ali parece “encantado”. A letra parece envolta num casulo. Penso na voz como potência criadora, capaz de tirar a letra do estado de “encasulamento”. Faço uma imagem mental daquela ação vocal do mito da criação: "faça-se", e que por meio dela tudo passou a existir...

27 agosto 2007

palavra I

Entro na biblioteca e contemplo os livros nas prateleiras. Enquanto os observo, o pensamento me transporta para uma cena da adolescência: estou no sertão. Sinto o cheiro de terra molhada pelas primeiras chuvas do ano. O barulho das gotas nas telhas anuncia que em breve, aquele quadro de natureza morta, dará lugar a uma paisagem viva. Em pouco tempo, ouço os coaxos dos sapos, que parece surgirem do nada, fazendo a festa nas poças e grotas. Em menos de três dias, do torrão antes seco e rachado, as sementes “desencantam” e brotam em tufos, espalhando o verde na caatinga. No cenário de ressurreição, a vida vibra e tudo respira renascimento. O ar cheira a fertilidade. Nas folhas novas das árvores surgem lagartas de muitos tamanhos e cores. Elas logo se dirigirão aos outões das casas, aos lugares protegidos da chuva e se transformarão em casulos, aguardando o tempo certo de se tornarem belas borboletas...